Apresentação - texto


Ciências da Emergência 

A competitividade, a flexibilidade, a globalização, as lutas contra a pobreza e a exclusão, as crises ecológicas, as crises de segurança, a guerra, a prevenção e contenção dos efeitos de catástrofes naturais ou ecológicas, ou outras, provocados pela desigualdade social e pela injustiça, a minimização de danos derivados da mobilidade e de consumos de massas, caracterizam a sociedade de risco. Também conhecida como sociedade pós-industrial, sociedade do conhecimento, sociedade penal, sociedade das redes, sociedade global, humanidade e outros nomes.

A crise do Estado nacional e as dificuldades em levar à prática as ideologias dominantes – que pressupõem a menor influência dos Estados na vida privada, quando o que ocorre é precisamente o inverso, frequentemente por formas inesperadas e imprevistas – abre campo a novas necessidades necessariamente formuladas a partir de disciplinas profissionais e científicas desenvolvidas quando o Estado Social se afirmou politicamente. É o caso das ciências da saúde, das ciências sociais e do direito.

Todas estas disciplinas estão em crise de desajustamento relativamente às novas condições de exercício profissional e disciplinar, nomeadamente ao nível do ensino e da investigação. Cada vez mais os sistemas de saúde dos estados mais poderosos são chamados a velar e responder aos problemas de saúde globais, em particular dos países com sistemas de saúde precários. A saúde não é apenas uma questão bio-médica, é também um problema industrial e comercial (de patentes e de acesso aos cuidados de saúde) e de desenvolvimento (a consideração dos interesses dos povos sem acesso ao poder no quadro da governação). O direito internacional torna-se direito global por formas estranhas às práticas anteriormente conhecidas – através de tribunais internacionais sem respaldo estatal e através de auto proclamação da legitimidade de jurisdição global por parte de certos tribunais nacionais. Ditadores são perseguidos de diversas formas, e a justiça é feita em condições de alguma precariedade, frequentemente contraditória com os princípios doutrinados. As teorias sociais feitas para responder a problemas nacionais, especializadas por sensibilidades nacionalistas, enfrentam hoje o desafio das fronteiras que se reformulam formal e informalmente, no seio da União Europeia mas também através dos desafios da imigração.

Emergência significa as profissões preparadas para trabalhar das formas mais flexíveis e em função das finalidades (bombeiros, emergência médica, missões humanitárias, cuidados de saúde ambulatórios, actividades de prevenção, actividades de redução de danos nos campos da saúde, da política, da protecção social, luta contra os pânicos sociais através dos media, lutas em defesa das liberdades, etc.)

Emergência também significa as instituições e os recursos que enquadram estas profissões e as actividades voluntárias que as substituem frequentemente: ajuda ao desenvolvimento, caridade social, filantropia, organizações não governamentais, actividades sociais das empresas, associativismo, lobbying político, etc.

Emergência significa ainda a necessidade de estruturar sistemas de avaliação susceptíveis de produzirem conhecimento sobre as práticas e resultados profissionais, institucionais e de missões e de servirem de base à eficiência e profissionalização dos serviços de emergência.

Emergência implica encetar a partir da formação superior a colaboração interdisciplinar de modo a que a cooperação dos profissionais se possa estabelecer no terreno por forma a produzir sinergias, em vez de se constituírem em formas de competição entre diferentes formas disciplinares de entender o mundo e a relação com ele.

Para responder a este último desafio, a cooperação entre professores/investigadores disponíveis em trazerem as contribuições das diversas disciplinas para o terreno da mútua compreensão e articulação é prévia à possibilidade de, nas profissões, os profissionais possam mudar de atitude dominante. Menos corporativa e mais desenvolvimentista em função dos direitos humanos das vítimas das situações de emergência.


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